Observa-se também uma tendência “cíclica” nos gostos das pessoas, sendo que as classes hierarquicamente “inferiores” vão incorporando certos gostos das “superiores”, que, por sua vez, vão adquirindo novos, mantendo o caráter de distinção social.
    ... a história do acabamento das cores em móveis é bem peculiar, porque são ciclos que acontecem. Normalmente a cor que a classe A consome é a que amanhã a classe B vai estar consumindo, e depois vai chegar na classe C. O marfim, por exemplo, começou na classe A. O marceneiro fazia o produto em madeira de marfim, em lâmina de marfim, e depois isso partiu para a classe B. Os nossos produtos, há 4 anos atrás, entraram fortemente no marfim. E antes era a cor mogno. Hoje, no popular, na classe C, já se vende muito o marfim. E isso vai gerando um ciclo. Depois do marfim veio o tabaco, que passou depois para a classe B, e hoje já está começando a entrar na classe C. E, na classe A, já entrou o castanho, que nós já estamos começando a produzir na B, e, com certeza, amanhã ou depois vai entrar na C também. [...] A tendência é a de que amanhã, ou depois, volte o mogno, a cerejeira...; as cores que sempre vão se repetindo (RODRIGUES, 2001). [sem grifo no original]


As tendências de design também tem sido influenciadas pelos recursos tecnológicos empregados. “O uso de papéis vai facilitar que se tenham mais cores. Hoje, no mercado, o uso de cores é limitado. A tendência é a de que se tenha uma abrangência muito maior de cores com a existência desses papéis”, observa Rodrigues (2001).

“Existe uma diferença muito grande no mercado brasileiro”. Entretanto, as empresas em geral têm tratado “nacionalmente” a questão do design de produtos e adotado estratégias de segmentação de mercado, trabalhando com determinadas linhas de produtos. “... no mercado do Mercosul, tem-se uma tendência mais do Sul do Brasil... Então, mais ou menos o que é feito para esse segmento de mercado, é feito para o Mercosul”, afirma Torresan (2001)

. A Escriba, que atua no segmento de móveis para escritório, não tem diferenciado o design de seus produtos, de acordo com os mercados regionais, assim como das empresas em geral que participam deste segmento.

O design de móveis para escritório do Brasil traz fortes elos com princípios do Funcionalismo e tem convergido, sobretudo, com tendências européias.

A seleção de móveis para escritório e o planejamento dos mesmos em ambientes de trabalho têm estado bastante vinculados à atuação profissional dos arquitetos.

Na Escriba, a composição do espaço, o tratamento cromático, a racionalização da ocupação do espaço arquitetônico e o layout “reflete o que a empresa [cliente] é e o que a empresa faz”, acompanhando as suas transformações, em termos de organização do trabalho, segundo Calejo (2001).

A Escriba tem trabalhado com modularização de componentes, que permite a composição de layouts variados, a partir da gama de produtos comercializados pela empresa. E a configuração de layouts tem caminhado em direção a composições mais orgânicas, tanto no mercado brasileiro, quanto no externo,
observa Calejo (2001).

Assim como a Escriba, a maioria das indústrias moveleiras, nacionais e estrangeiras, têm seguido estratégias de uso de plataformas básicas e modularização de componentes, o que tem limitado consideravelmente a diversificação do design de móveis, promovendo a padronização dos mesmos. Isto tem ocorrido, de praxe, com móveis de cozinha e dormitório industrializados.

Soluções padronizadas de produtos, independentemente das mesmas estarem voltadas ao mercado global, regional ou nacional, têm deixado lacunas significativas, em termos do atendimento de requisitos mais específicos da sociedade.

Pesquisas de mercado, realizadas no Brasil, demonstram que nem sempre os requisitos de produtos para as pessoas deste país convergem com tendências internacionais, salientando a necessidade se considerar a questão da diversidade cultural no design industrial. Trevisan (2001) e Rodrigues (2001) destacam a importância das pesquisas de mercado, a exemplo de experiências vivenciadas pela Rudnick.
    Apareceram coisas sobre as quais a gente não imaginava. Nós damos importância para o interior do móvel e sempre procuramos fazer o melhor possível, mas, de repente, a pessoa chegou e disse assim: "Eu não compraria, porque essa gaveta é de outra cor". Então, a divisão era boa e atendia à necessidade que ela tinha, em termos de praticidade, e a pessoa não gostou do simples tom da cor. Ela gostava de tudo uniforme. Disse também: "O puxador aqui é de alça, então porque lá não é de alça". Então, havia umas coisas assim que, para nós, para a nossa cabeça, deixava o móvel bonito, porque na Europa a gente vê muitos puxadores misturados (ponto com alça, etc), e os brasileiros, pelo jeito, gostam da coisa mais certinha. Aqui a gente fazia muito esse jogo, e não é isso que eles querem (TREVISAN, 2001). [sem grifo no original] Às vezes, é claro, a gente segue até uma tendência internacional, ou mesmo nacional, só que, às vezes, não é isso que o consumidor está esperando do produto. Ou, às vezes, em alguns detalhes, aos quais se dá importância, mas não tanta importância como se deveria, como, por exemplo, na questão dessa gaveta ser exatamente da mesma cor que do restante do móvel, é um detalhe que nos levou a fazer um ajuste no projeto para chegar naquela cor exata (RODRIGUES, 2001). [sem grifo no original]


Experiências de insucessos comerciais, tais como o do armário Pratique, e de sucessos, como o do Verona Teen, vivenciadas pela Rudnick, demonstram como as pesquisas de mercado são fundamentais para o desenvolvimento de produtos. “O Pratique tinha tudo para dar certo, e não sabíamos porque a coisa não ia. E, de repente, dele surgiu o Verona Teen, que agora é sucesso”, relata Trevisan (2001) (Figura 368).
FIGURA 368 -	DORMITÓRIOS “PRATIQUE” E “VERONA TEEN”, DA RUDNICK (BRASIL, 1998; 2000)
FIGURA 368 -	DORMITÓRIOS “PRATIQUE” E “VERONA TEEN”, DA RUDNICK (BRASIL, 1998; 2000)
FIGURA 368 - DORMITÓRIOS “PRATIQUE” E “VERONA TEEN”, DA RUDNICK (BRASIL, 1998; 2000)
    ... todos os produtos que foram desenvolvidos com base nessas pesquisas foram produtos campeões [em vendas]. Então, a chance de acerto do produto é muito maior. É claro que uma pesquisa dessas tem um investimento que não é baixo, mas o retorno também é grande e justifica. Nós tínhamos o armário Pratique, e dele acabou surgindo um outro produto que é o Verona Teen, [...] a partir de uma pesquisa, que, no caso, foi qualitativa, onde se reúne um grupo de consumidores e se entrevista os mesmos, mostrando-se fotos de vários produtos. E aquele produto chamou a atenção. E tal produto fazia parte de um segmento ao qual não se dava tanta importância na empresa. E, a partir disso e de outros questionamentos que surgiram, foi desenvolvido um novo produto, que hoje é um dos campeões de venda da empresa (RODRIGUES, 2001).


Há casos de rejeição a determinados produtos, cujo design não condiz com o repertório simbólico das pessoas, apesar de agradar o designer que os desenvolveu. A Entrevistada “AD” relata uma experiência pessoal, em design de mobiliário desenvolvido na Rudnick, que ilustra este problema:
    Em uma das minhas experiências aqui na Rudnick, eu fiz um produto que usava uma cor bem forte, um laranja, e esse móvel a gente levou para a pesquisa. E foi horrível! As pessoas odiaram, não sabiam aonde que era para por o móvel... Acharam que era um móvel infantil... Então, há muitas coisas em que a gente acredita sobre o que é trabalhar, tendo uma linguagem, uma boa composição de cores... E, na verdade, as pessoas não estão preparadas para isso. Elas querem uma coisa básica mesmo, que elas já viram antes. E isso que é um pouco duro para a gente que quer estar sempre criando, inventando... A realidade de estar em uma indústria grande é um pouco diferente. Ás vezes nem se coloca design (ENTREVISTADA “AD”, 2001). [sem grifo no original]


É preciso, portanto, evitar-se a incorporação “cega” de tendências de design, bem como a priorização da visão do designer no desenvolvimento de produtos, em detrimento das necessidades e anseios dos usuários e consumidores, para que não se corra o risco de não se cumprirem os requisitos dos produtos para os mesmos e de sofrer insucessos comerciais.
    ... o designer sempre tem que estar pensando em levar qualidade de vida para as pessoas. E, tudo bem, se não der para ser muito ousado, mas, que pelo menos se desenvolva algo com ergonomia, funcionalidade; pelo menos uma coisa verdadeira, sem ornamentações inúteis. Então, muitas vezes, é uma questão de aprender a se controlar em sua ansiedade, e não colocar todo o seu ser designer ali (ENTREVISTADA “AD”, 2001). [sem grifo no original]
Salienta-se, assim, a necessidade das empresas e profissionais, envolvidos no processo de desenvolvimento de produtos, realizarem pesquisas mais aprofundadas acerca das características e necessidades das pessoas a quem os mesmos se destinam, considerando, com maior atenção, a diversidade cultural no design industrial.
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