E, nos Estados Unidos, há pequenos armários de vinho para salas de visitas (ver Figura 478).
FIGURA 478 - ARMÁRIO DE VINHOS PARA SALA DE VISITAS (“HOSPITALITY WINE CABINET”) DA KIMBALL HOME (EUA, 2004)
Observa-se, ao longo da história, que o design de móveis tem apresentado vários pontos de convergência com a arquitetura, no que tange aos requisitos principalmente simbólicos e de uso, embora, em muitos casos, apresentem divergências, em termos de linguagem.
A inter-relação entre o móvel e a arquitetura encontra-se presente também na hierarquização social que os móveis assumem no cotidiano da sociedade, nos espaços arquitetônicos, cuja concepção revela, a exemplo das residências, “... uma tradição intrínseca, um sentido de permanência na setorização, inclusive em valores segregacionistas” (VERÍSSIMO; BITTAR, 1999, p. 19), apesar da dinâmica das transformações sofridas na sociedade e na cultura material ao longo do tempo.
As modificações na arquitetura das habitações , espaços de trabalho e lazer, decorrentes das transformações da sociedade, no perfil da população e modos de vida, que incluem, por exemplo, os divórcios, as mudanças de locais de moradia, em função do trabalho e das condições econômicas, têm trazido implicações significativas ao design de móveis. (ver Figura 479)
Nós seguimos muito a construção civil, conforme o segmento de mercado. [...] hoje, o apartamento está muito reduzido, e temos que fazer móveis que se adaptem a isso, e até com multiversatilidade. Tem que ser versátil para isso. Às vezes, temos que fazer uma estante que vira cristaleira, rack para o som, e que tenha espaço para o computador. Então, isso está se misturando muito, em função das dimensões da construção civil. E, pela própria pressão do mercado, a gente está sempre em constante mudança aqui dentro.
... o número de divórcios também é muito grande, e as separações acabam formando dois apartamentos, bem diferentes do que se tinha anteriormente. São apartamentos menores, com móveis mais práticos. Isto é muito forte no Brasil. Existe também outro problema comum no Brasil, que é o seguinte: as pessoas de certo poder aquisitivo estão morando fora da cidade, e têm um apartamento alugado, pequeno, no centro da cidade, onde vêm para trabalhar durante a semana. No final de semana vão morar fora. [...] E também existe, por problemas em função de emprego, a pessoa que está sendo demitida, ou que está sendo transferida pela fábrica para outro local, e que tem que ir para outra cidade, o que está muito forte aqui no Brasil. Outra coisa forte no Brasil, além disso, é que a pessoa acaba vendendo o apartamento grande, porque está custando caro, e comprando um menor. E, então, a pessoa compra os móveis novamente. Estão se adaptando às dimensões menores mesmo as pessoas da classe média alta. Não têm mais apartamentos de 600 m2. Para elas, 250 m2 já está bom (TORRESAN, 2001).
FIGURA 479 - ESTANTE - COM CRISTALEIRA, PORTA-CDS, RACK PARA SOM, TV E DVD – E MÓVEL DE ESCRITÓRIO RESIDENCIAL (HOME OFFICE) – COM MESA PARA COMPUTADOR E ESTANTES PARA IMPRESSORA, SCANNER, APARELHO DE SOM E LIVROS - DA RUDNICK (BRASIL, 2003)
Os móveis de sala de jantar e de bar decresceram em grau de importância, porque as pessoas em geral recebem menos visitas em suas residências ultimamente
Antigamente se fazia noivado em casa, festa em casa, aniversário... Quem não se lembra da casa do pai e da mãe cheia de parentes e tal. E hoje a gente leva, como eu, faço na associação da Rudnick, ou em outra, pago lá dez reais para limpar tudo, e pronto! Então, não levo para casa a família, e, assim, não preciso de sala de jantar (TREVISAN, 2001).
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Assim como variam os espaços arquitetônicos, em termos de linguagem, dimensionamento, comunicação, tecnologia da construção, organização, sendo uns mais, e outros menos flexíveis, também os móveis precisam adequar-se às necessidades e anseios das pessoas, destacando-se a importância do desenvolvimento contínuo e aprofundado de pesquisas sobre o perfil e os modos de vida da sociedade.
Trevisan relata o caso do redesenho de um móvel da Rudnick, que não obteve sucesso no mercado, devido à falta de uma pesquisa prévia de mercado mais acurada.
Tem coisas, [...] que temos quase certeza de que serão um sucesso. Tínhamos uma sala famosa [, a San Marino], por exemplo, que tinha nove anos de mercado (isso há 8 anos atrás) e pediu-se para substituí-la, porque todo mundo, inclusive empresas da região, já a tinham copiado. Como se viu que as pessoas gostavam de porta curva, desenhei um móvel totalmente diferente, mas com o mesmo impacto formal (do espelho, da mesa, da cadeira). Mas, quando olhávamos um e outro, dava para dar um novo nome ao móvel redesenhado. Tinha as mesmas dimensões, mas quando a primeira série foi para o mercado, não foi..., não foi..., e eu não conseguia acreditar. E o gerente, então, disse: Vá para São Paulo ver o que está acontecendo. Então, eu fui conversar com os vendedores: "Por que a San Marino continua vendendo? Porque vocês já estão acostumados a vendê-la e já sabem que o cliente gosta dela? E por que é que a Inglesa não está vendendo?". E um vendedor respondeu: "O que o pessoal diz é que o brasileiro tem criança, e a quina é viva e o da outra linha é curva". E na cadeira havia entrado a moda do espaldar, que hoje é estofada, e eu inventei de por estofado no encosto e de fazê-lo mais quadrado [no modelo de sala Inglesa]. E a mesa antiga tinha um chanfrado, e eles gostavam dela, porque ninguém batia nela. Então, depois de visitar umas oito lojas, eu concluí que esse vendedor havia matado a charada. Um vendedor e uma vendedora falaram que o que acontecia era que eles gostavam da arca e queriam mostrá-la ao consumidor, mas achavam que a cadeira atrapalhava a visão da arca. Então, eu tive que voltar a por ripado na cadeira, do qual já estava enjoado, e tive que voltar a pôr o tampo chanfrado na mesa (TREVISAN, 2001) (ver Figura 480).
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FIGURA 480 - SALA DE JANTAR “INGLESA” DA RUDNICK (BRASIL, 1994)
Salienta-se, portanto a necessidade de se direcionar mais o design aos usuários e contextos em que vivem, a fim de cumprir as funções requeridas.
Não é mais possível desenvolver, conceber e realizar idéias em laboratório, só dentro de estúdios. Hoje, é muito fácil se ter acesso à tecnologia, a informações, a tudo que se precisa para projetar um produto, e realizá-lo quase sem contato com quem vai usá-lo. [...] hoje os designers e os arquitetos precisam estar muito mais voltados para o usuário e para os ambientes em que as pessoas vivem. Os objetos não precisam ser geniais, no sentido naïf, fraco do termo. Os produtos precisam ser bons e cumprir o que se espera deles (CALEJO, 2001). [sem grifo no original]
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